Por Paulo Márcio
A cerimônia de abertura da Copa do Mundo de 2014 foi marcada pela cafonice e pelo mau gosto. Seguindo a orientação da patrulha feminista do PT, a organização do evento até que tentou fugir dos lugares-comuns que remetem às apresentações de Sargentelli e Suas Mulatas – as filhas das classes trabalhadoras exploradas pelo machismo branco burguês, como diria Maria do Rosário. Lamentavelmente, a criatividade deu lugar à canhestra sociologia e o que se viu foi um espetáculo pobre, monótono e distante da ideia que pretendia transmitir: a representação artística de algo que traduzisse a identidade cultural brasileira.
O maior destaque da festa foi protagonizado por boa parte dos 62 mil espectadores, que vaiaram e xingaram a presidente Dilma Rousseff, escondida ali na cabine de honra ao lado do insaciável Joseph Blatter. Ao vivo e em cores, mandamos pelos ares valores e conceitos como educação, civilidade e autoridade. Nem a beleza de Pitbull e o rebolation de Cláudia Leite e Jennifer Lopez ao som de “We are one”, também conhecida como “Ole, Ola” ou “Samba do Gringo Doido”, foram capazes de salvar nossa imagem perante o mundo.
A Fifa e o Governo Federal passaram quatro anos vendendo ao mundo a imagem de um Brasil pós-moderno, civilizado, pacífico, cheio de encantos mil. Substituída a publicidade pela realidade, expusemos de bate pronto nossa verdadeira face antes mesmo de a bola rolar em campo. Não havia dúvida: a pátria de Pelé, Romário, Ronaldo, Neymar e tantos outros craques é também a pátria dos mais de 50 mil assassinatos por ano, da corrupção institucionalizada, do estado aparelhado, das obras inacabadas, da incompetência nos três níveis de governo, da saúde falida, da arrogância dos mandatários, do jeitinho, enfim, das mazelas que nenhum marqueteiro, por mais talentoso que seja, consegue encobrir.
É óbvio que, como a maioria de pessoas de bom senso, não faço apologia de vaias nem de ofensas a quem quer que seja, principalmente a uma mulher, mãe e avó. E não é por diferenças ideológicas ou interesses políticos que irei transigir com meus valores para incentivar ou justificar tão desatinados atos. Quem vaiou a Presidente da República – que poderia ser o presidente FHC, Lula ou Sarney -, seja de esquerda, de direita ou de centro, ou nada disso, como é o PSD de Kassab, está abaixo do nível da festa inaugural que tanto nos envergonhou. Bem abaixo. Gente tão incivilizada pertence à mesma ralé moral que incendeia viaturas, depreda prédios públicos e particulares, infiltra-se em manifestações para praticar atos de vandalismo.
A despeito da desorganização cantada em verso e prosa, a Copa do Mundo, com seus erros e acertos, está servindo para muita coisa. Uma delas é estimular o debate sobre o Brasil real e profundo. Sobre o país cujas verdadeiras carências estão fora dos gramados e arenas. Enfrentá-las é tarefa que exige competência, compromisso e coragem. E não é com vaias e xingamentos que iremos resolvê-las.
PAULO MÁRCIO é Delegado de Polícia Civil desde 2001. Especialista em Gestão Estratégica em Segurança Pública (UFS) e em Direito Penal e Direito Processual Penal (Fase). Foi Presidente do Sindepol-SE, Superintendente de Polícia Civil de Sergipe, Corregedor Geral de Polícia Civil. Atualmente é titular da 5ª Delegacia Metropolitana. É colunista do portal Universo Político.com.br.Contato: [email protected]