Por Josué Modesto dos Passos Subrinho
No final deste ano Sergipe se incorporará ao grupo de estados brasileiros que realizam avaliações anuais da educação básica, envolvendo as redes municipais e a rede estadual. Finalmente supriremos uma lacuna que deixava às cegas os dirigentes educacionais e gestores escolares interessados em obter indicadores seguros e comparáveis do desempenho dos seus estudantes nas diversas etapas educacionais.
É verdade que todas as escolas públicas são submetidas ao Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), com provas aplicadas bienalmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Os resultados padronizados obtidos nas provas e ponderados pelo indicador de aprovação dos estudantes produzem o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), por etapa avaliada. Os resultados, divulgados em sínteses estatísticas são importantes, especialmente para subsidiar decisões lastreadas em evidências. Não obstante ser uma conquista da educação brasileira, o SAEB possui duas importantes limitações: a) sua realização é bienal, com divulgação no ano subsequente ao ano de realização, o que significa, por exemplo, que até meados de 2022 o conjunto de dados disponíveis acerca das escolas públicas sergipanas terá como base o resultado de um exame realizado em 2019, ou seja, estamos e continuaremos olhando para uma realidade educacional com significativa defasagem temporal; b) os dados com maiores detalhes por turmas, resultados por conteúdos avaliados, comparativos com o desempenho da escola e das redes, por exemplo, não chegam facilmente aos gestores de redes e de escolas.
Para superar essas limitações e ainda com o objetivo de obter resultados que sirvam de subsídios ao planejamento das intervenções pedagógica das escolas, formação continuada de professores e de dirigentes de redes e de escolas, análise dos fatores que interferem na aprendizagem dos alunos em um ano, para o cálculo do Índice de Desempenho Escolar em Sergipe – IDESE, programas de melhoria da qualidade de ensino nas redes municipais e rede estadual e, finalmente, fortalecimento do regime de colaboração entre o estado e os municípios, foi aprovado, através da Lei 8.595, o Sistema de Avaliação da Educação Básica de Sergipe – SAESE.
A principal inovação do SAESE, que produzirá indicadores compatíveis com os produzidos nacionalmente, será sua realização anual, ao fim de cada ano, com disponibilização de dados detalhados para cada escola estadual ou municipal no início do ano seguinte, permitindo uma adequada calibragem das estratégias educacionais utilizadas por cada unidade, tendo em vista o resultado obtido no ano anterior e avaliada por uma escala que é a mesma utilizada pelo sistema nacional.
Avaliações externas de larga escala realizadas anualmente estimulam um sistema de monitoramento para antecipar resultados e prevenir trajetórias de insucesso. Na rede estadual de Sergipe, por exemplo, antecipando a realização do SAEB e do SASE, no fim deste ano, e tendo em vista a dramática situação educacional decorrente da longa suspensão das atividades presenciais, tem-se praticado a aplicação de avaliações diagnósticas e o controle de indicadores pedagógicos, disponibilizados publicamente. A construção desses indicadores foi facilitada pela adoção do diário de classe eletrônico que permite e facilita o tempestivo acompanhamento pelo (a) professor (a) e, também, pela escola, pelas diretorias regionais de educação e pelos dirigentes educacionais. Além do próprio percentual de preenchimento de diários, são monitorados os indicadores de aluno em risco escolar e defasagem idade-série.
O risco escolar é formado por dois conceitos: frequência mínima, alertando quanto ao número de alunos que não estão alcançando o mínimo legal de 75% de frequência e rendimento mínimo de 5,0 nas avaliações definidas pela escola. Obviamente, a expectativa é que a escola acionará a busca ativa dos estudantes infrequentes e planejará atividades de intensificação de aprendizagem para os que estejam apresentando rendimento inferior ao esperado. Um leitor menos familiarizado com o ambiente escolar poderá indagar se isto não parece estar implícito como obrigação das escolas. Acontece que se não existe monitoramento sistemático, os sinais de alerta não são acionados, e se eles não são acionados, não se tomam providências tempestivas para correção de rota.
Outro indicador monitorado é a defasagem idade-série. Este é calculado no momento da matrícula, assinalando o percentual de alunos cuja idade está acima de dois anos da considerada ideal para a série em que ele está matriculado. A partir desta informação a escola pode criar turmas especiais com os alunos em distorção para apoiá-los a reconstruir trajetórias de sucesso escolar. Deve-se dizer que há uma forte evidência que a presença de alunos com defasagem idade-série não é benéfica para o convívio com estudantes em idade regular e o sentimento é mútuo. A continuidade da situação de defasagem frequentemente leva a repetição do fracasso escolar e finalmente ao abandono. Sergipe apresenta um dos mais elevados índices de defasagem idade-série do Brasil. Por esta razão, é muito importante apoiar as escolas para a correção da trajetória escolar de parte significativa de nossos estudantes.
O SAESE, ao gerar o IDESE, permitirá o início da construção de um vetor para redistribuição da quota municipal do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o chamado ICMS-Social, que em Sergipe já é lei, mas que foi incluído como uma das inovações da Emenda Constitucional 108/2020, que entre outras mudanças instituiu o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Nossa expectativa é que ele também contribua para a consolidação do regime de colaboração entre o estado e os seus municípios, induzindo estes às melhores práticas educacionais, contando para tanto com o suporte técnico do Estado e, eventualmente, com apoio financeiro, quando couber.
São, portanto, muitas as razões para saudarmos a aplicação do SAESE. Ele consolidará uma nova fase da gestão educacional baseada em evidências, orientada por estratégias de longo prazo, a exemplo do Plano Nacional de Educação e do novo FUNDEB. As condições para obtermos melhores resultados educacionais estão dadas, e estes certamente serão colhidos, mesmo que adversidades imprevistas, a exemplo da atual pandemia, bloqueiem temporariamente uma trajetória que está sendo arduamente construída por defensores da escola pública.
*Josué Modesto dos Passos Subrinho é secretário de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura (Seduc) -, e foi reitor da Universidade Federal de Sergipe e da Universidade Federal da Integração Latino-Americana no Paraná.