Existem em Sergipe, de acordo com dados da Empresa de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Emdagro), 102 fábricas de laticínio sem inspeção (individuais) e 800 queijarias caseiras que absorvem 32,5% da produção de leite da região do Alto Sertão de Sergipe. Somente oito indústrias têm registro no serviço de inspeção e a grande maioria dos proprietários desconhece as normas sanitárias e as boas práticas de produção. Essas questões e outras dificuldades enfrentadas pelos pequenos e médios produtores de leite da região foram expostos e debatidos durante o seminário realizado pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados (CAPADR), que aconteceu na Associação Atlética Banco do Brasil, no município de Nossa Senhora da Glória, na última sexta-feira, dia 18. Para os produtores, o evento, proposto pelo deputado federal João Daniel (PT/SE), foi de fundamental importância, porque o tema pode ser tratado diretamente com os órgãos que estão envolvidos nessa atividade econômica essencial para o Estado e, principalmente, para a região.
Estiveram presente ao seminário os prefeitos de Glória, Francisco Carlos Nogueira Nascimento, o Chico do Correio; de Canindé do São Francisco, Heleno Silva; o presidente da Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa, deputado Jairo Santana; o secretário de Estado da Agricultura, Esmeraldo Leal; o secretário de Agricultura de Poço Redondo, José Fernandes, que também representou o prefeito Roberto Araújo; os superintendentes em Sergipe do Incra, do Ministério da Agricultura, da Conab e Codevasf, André Bomfim, Jadson Costa Santos, Emanuel Carneiro, Said Schoucair, respectivamente; representante do Banco do Nordeste, Volnandy de Aragão Brito; representante da Embrapa Semiárido, Sérgio Guilherme de Azevedo; além de representantes da Universidade Federal de Sergipe (UFS), do Instituto Federal de Sergipe (IFS), Secretaria de Estado da Inclusão e Desenvolvimento (Seidh), Emdagro, vereadores e secretários de municípios da região, movimentos sociais, como Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), técnicos de assistência técnica, dentre outros.
Representando a Comissão de Agricultura, o deputado João Daniel ressaltou a importância desse evento, realizado na própria região. O parlamentar lembrou que ele sempre, desde quando deputado estadual, encampou essa luta em defesa das pequenas queijarias e laticínios, ciente das dificuldades que eles encontram para se regularizar. João Daniel acrescentou que quando assumiu o mandato federal essa questão esteve entre suas prioridades, diante a importância da cadeia produtiva do leite para a economia do Estado e do Alto Sertão. “Nosso objetivo é que tudo que foi discutido aqui seja dado encaminhamento à Comissão de Agricultura e vamos acompanhar”, disse, ao acrescentar que também iria propor emendas ao Orçamento da União no sentido de desenvolver a agricultura e fortalecer a economia da região.
Diagnóstico
Um diagnóstico completo da situação vivida por produtores de leite foi apresentado durante o seminário por Fábio Weber Souza Costa, representando o Colegiado do Território do Alto Sertão sergipano. Em sua explanação, ele destacou que nessa região a produção leiteira é responsável por 70% do Produto Interno Bruto (PIB) do Território. O Alto Sertão possui uma população de aproximadamente 150 mil habitantes, compreendendo mais de 11 mil famílias de agricultores familiares, mais de 5 mil famílias assentadas, mais de 90 projetos de assentamento de Reforma Agrária, quase 500 famílias de pescadores, três comunidades quilombolas e uma área indígena, na Ilha de São Pedro, em Porto da Folha.
Nessa região, de acordo com dados da Emdagro e o IBGE entre 2011 e 2013, existem mais de 8 mil criadores de bovinos na região, distribuídos nos sete municípios (Canindé de São Francisco, Gararu, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Nossa Senhora de Lourdes, Poço Redondo e Porto da Folha), sendo responsáveis pela produção de quase 180 milhões de litros por ano, com mais de 81 mil vacas ordenhadas, e gerando uma renda anual próxima de R$ 140 milhões.
No contexto específico das agroindústrias, o diagnóstico que quase todas as fábricas de laticínios são sem inspeção, assim como as queijarias. Somente oito indústrias na região possuem registro no serviço de inspeção (quatro no SIF e outras quatro no SIE). No entanto, elas são responsáveis por uma quantidade significativa de empregos gerados. O representante do Colegiado do Território ressaltou o grande potencial da região do Alto Sertão sergipano para impulsionar o desenvolvimento do Estado de Sergipe, mas relacionou as dificuldades enfrentadas pelos produtores familiares, especialmente no tocante aos processos de certificação dos produtos oriundos das agroindústrias, dificultados pela excessiva burocratização e as exigências apresentadas, que são as mesmas exigidas das indústrias de grande porte, e apresentou propostas com o objetivo de dinamizar a economia da região.
Força produtiva
A visão dos produtores familiares da região foi retratada durante o seminário por Erivan Aragão, o Nengo, e Carlos Oberto Aragão. Eles reafirmaram a força produtiva da região, compreendendo 40% da população rural estadual e respondendo por mais de 70% da produção leiteira de Sergipe. Ambos evidenciaram o fato de que a bacia leiteira se desenvolveu a partir da parceria com os governos federal e estadual, por meio da construção de barragens e da assistência técnica, de forma que, na atualidade, se faz necessário que sejam implementadas medidas de apoio aos produtores, a fim de que os mesmos possam sair da informalidade, dando cada vez mais garantia aos seus respectivos consumidores e acabando com a dependência dos grandes laticínios, que atuam no mercado de acordo com as suas conveniências, inclusive comprando o produto em outros Estados.
Eles propuseram a construção de uma política de valorização dos agricultores familiares, para que se torne possível vencer os obstáculos e modernizar a produção, inclusive pelo fato de que a atual idade média dos produtores é alta, o que aponta para a necessidade de que os jovens do meio rural sejam incentivados a se qualificar na perspectiva de gerir os empreendimentos no futuro, sem a necessidade de se deslocar para a capital. Apontaram a criação de uma coordenação regional para supervisionar e realizar a intermediação entre a cadeia produtiva do leite, os órgãos governamentais e o mercado como uma medida importante a ser adotada.
Ações
Cada um dos representantes do poder público presentes ao seminário também falou de suas ações e teceu observações quanto às reivindicações apresentadas pelos produtores. O secretário Esmeraldo Leal destacou que o atual governo estadual tem como princípio o diálogo com todos os segmentos, de forma que as reivindicações dos territórios e dos produtores familiares estão na pauta da própria Secretaria de Agricultura e Desenvolvimento Rural; apresentou diversas medidas que estão sendo implementadas pelo órgão, inclusive em parceria com outras instituições governamentais, a exemplo da Codevasf e da Conab. “É de fundamental importância a realização deste seminário em razão dos seus desdobramentos no sentido de pressionar os governos Estadual e Federal por cada vez mais políticas públicas direcionadas ao sertão”, acrescentou.
André Bomfim, superintendente do Incra, destacou a existência de 93 projetos de assentamento e três comunidades quilombolas na região, sendo beneficiadas com investimentos do órgão, que está com as suas portas abertas para o encaminhamento de soluções para os problemas apresentados. O superintendente da Codevasf, Said Schoucair, ressaltou a existência de vários projetos sendo planejados e executados em parceria com o Estado de Sergipe, como é o caso do “Água para Todos” e do “Canal Xingó”, explicando que, apesar das dificuldades atuais relacionadas ao contingenciamento de recursos orçamentários, com a união de todos as propostas sairão do papel.
Já o superintendente do Ministério da Agricultura, Jadson Costa, destacou a Instrução Normativa nº 18, que foi elaborada para simplificar e desburocratizar os processos de inspeção e certificação, sendo fundamental, também, que se desburocratize o acesso ao crédito por parte dos agricultores familiares. Por sua vez, o superintendente da Conab, Emanuel Carneiro, afirmou, entre outros pontos, que está sendo discutida a criação de uma unidade de armazenamento e comercialização no município de Nossa Senhora da Glória, além de estar trabalhando para aumentar ainda mais em 2016 a distribuição de sementes, incentivando a produção para aquisição dentro do Estado.
Sérgio Guilherme, representantes da Embrapa-Semiárido de Petrolina (PE), defendeu que o semiárido é uma região viável, mas precisa de incentivos para garantir eficiência e viabilidade na produção. Lembrou que a Embrapa é parceira na busca de soluções para várias demandas apresentadas, pois as mesmas fazem parte da expertise da empresa, de forma que a mesma está à disposição para colaborar com os produtores.