Num artigo publicado aqui no Universo, nesta sexta-feira, dia 29, o jornalista e ex-presidente do PT de Sergipe, Silvio Santos, lamenta o que define como “desconstrução do jornalismo e do seu papel na defesa da verdade dos fatos e, em última análise, dos interesses da sociedade”. Silvio salienta que há dois caminhos a seguir como profissional de jornalismo: assessoria de imprensa; ou seu próprio veículo de comunicação – sites, blogs. “É aí onde temos outro imenso problema. Tanto num caso quanto no outro, o grande empregador e ou patrocinador é o Estado e este, na nossa cultura coronelista, não pede, manda”, afirma.
Texto na íntegra
Carta aos amigos e colegas jornalistas
Por Silvio Santos
Caros amigos,
Vocês sabem o respeito que tenho por todos e, especialmente, o apreço que dedico a vocês, colegas jornalistas. É em nome desses sentimentos que vos escrevo essas mal traçadas linhas. Mas do que formação em comunicação social, eu tenho uma verdadeira paixão pela profissão de jornalista e uma imensurável admiração pelo seu papel na história.
Dito isto, assisto com perplexidade a desconstrução do jornalismo e do seu papel na defesa da verdade dos fatos e, em última análise, dos interesses da sociedade. As novas tecnologias, e uma lógica perversa que busca transformar o jornalismo em entretenimento, onde a busca por likes e audiências ocas, permite que futilidades e manchetes espalhafatosas sejam mais importantes que uma rigorosa e vigorosa apuração de fatos de interesse público, têm sido fortes adversários.
Mas não é somente esse o nosso problema. Num estado como o nosso, onde duas Universidades formam algumas dezenas de jornalistas por ano – e isso não é problema – e onde, dos poucos veículos de comunicação que existiam num passado recente, minguaram em quantidade, restaram apenas dois caminhos a seguir como profissional de jornalismo: assessoria de imprensa; ou seu próprio veículo de comunicação – sites, blogs, etc. -. É aí onde temos outro imenso problema. Tanto num caso quanto no outro, o grande empregador e ou patrocinador é o Estado e este, na nossa cultura coronelista, não pede, manda.
Vivemos, nesse ponto, um grande dilema e eu entendo. Há uma peleja que sei que aflige a muitos: Independência x Sobrevivência. E quando se trata de sobrevivência, botar comida na messa da sua família, custear a escola dos filhos, etc., não dá para simplesmente cobrar uma coragem suicida. É preciso ter consciência para reconhecer essa situação e fazer o diagnóstico correto, receitar o remédio certo para curar esse mal que afeta também o jornalismo. Entender que o câncer que nos mata está no modelo de Poder que existe e que sequela não só o jornalismo, mas toda a sociedade.
Mas, amigos, eu entendo que, mesmo fazendo opção pela Sobrevivência e tendo que se entregar aos leões, é preciso fazê-lo com alguma dignidade. E, é preciso reconhecer, alguns colegas assim o fazem. Outros talvez, espero, venham a fazer. Não se trata de aconselhar ou ensinar nada, mas entendo que algumas posturas podem ser superadas. Para agradar o patrão ou patrocinador, não se deve ser mais realista que o rei; não deve fazer da legitima sobrevivência uma corrida para ver quem chega em primeiro lugar na corrida dos puxa-sacos; não deve se rebaixar tanto a ponto de desejar saúde ao “chefe” pelo espirro que ainda nem aconteceu; não deve escrever textos com o fígado, assumindo um ódio que nem o seu patrocinador nutre pela vítima de suas biles. Ainda que haja algum grau de submissão – não existe almoço grátis -, tem que haver um limite, do contrário, logo logo, você ficará tão desacreditado que se tornará um peso e, assim, descartável.
Encerro a presente missiva, desejando uma Feliz Páscoa para todos e parodiando o grande Mário Quintana: os poderosos passarão… o jornalismo, passarinho!
Silvio Santos é jornalista