A reforma tributária e seu impacto nos municípios brasileiros. Esta foi a temática da palestra do prefeito Edvaldo Nogueira (PDT), presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), nesta sexta-feira, dia 19, no almoço do Grupo de Líderes Empresariais (LIDE) de Sergipe.
Também fizeram parte da mesa o vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcos Cintra, e o ex-presidente da Receita Federal, Everardo Maciel, que abordaram as transformações geradas pela reforma nas empresas e nas famílias brasileiras. Em comum, os três palestrantes afirmaram que as principais propostas de reforma tributária no país não resolvem os problemas mais urgentes e não simplificam nem reduzem a carga de impostos.
“Estamos vivendo um momento muito importante para o nosso país. Muitas discussões para o futuro do Brasil estão sendo postas e a reforma tributária é uma delas. Hoje nós temos uma carga tributária altíssima e há um consenso de que precisamos fazer uma reforma o quanto antes, reduzindo e simplificando os impostos. Mas para que essa reforma seja feita, ela precisa considerar diversos pontos, sendo um deles o fato de que ela não pode acontecer de uma maneira que prejudique os municípios. Nós estamos na ponta. É na cidade que os serviços são prestados aos cidadãos. Isso significa que, se a reforma não for bem feita, ela poderá desencadear uma nova crise de desenvolvimento econômico no país. Portanto, é um debate que se faz necessário e que deve envolver toda a sociedade”, destacou o prefeito.
Presidente-executivo do Lide Sergipe, Victor Rollemberg disse que a participação do prefeito Edvaldo Nogueira no evento, “engrandeceu o debate”. “Foi uma honra ter o prefeito Edvaldo em nosso evento. Primeiro por ele ser um político eleito pela quarta vez como prefeito de capital, o que é inédito no Brasil, segundo por ele, como presidente da Frente Nacional de Prefeitos, estar completamente envolvido nos principais debates sobre a reforma tributária. O prefeito foi muito didático quando colocou que municípios acima de 200 mil habitantes sofrerão impactos severos se a reforma tributária foi construída da maneira que está sendo posta. Como ele mesmo disse, é preciso que haja um diálogo com o governo federal, com o Ministério da Fazenda, com os relatores das PECs em discussão, e com a sociedade, para que uma reforma justa seja construída”, salientou.
Ajuste à realidade
Primeiro palestrante do evento, o ex-presidente da Receita Federal, Everardo Maciel, afirmou que a reforma tributária depende do projeto que for implantado e frisou que, na sua visão, precisa se ajustar à realidade do país. “Não é uma solução mágica para os problemas nacionais”, disse.
Everardo destacou que há requisitos mínimos para uma reforma, entre eles a observância de cláusulas pétreas constitucionais, como o Pacto Federativo. De acordo com ele, as Propostas de Emenda à Constituição (PEC’s) 45 e 110 – os principais projetos em discussão no país – são uma “ofensa ao Pacto Federativo”. “Além disso, cria-se um comitê gestor, que me parece uma controvérsia constitucional. Não acredito que vá funcionar”, frisou.
Para ele, as duas propostas servem de estímulo à evasão fiscal. “Começa pelo princípio do destino, tem os falsos créditos de serviços, a prestação de serviços sem nota fiscal, entre outros, além de um aumento desproporcional da carga tributária no setor de serviços. Vai beneficiar as cadeias industriais longas e instituições financeiras, mas prejudica o setor de serviços, o agronegócio, a construção civil, setores de alimentos, saúde e educação. Haverá aumento de carga tributária nestes setores todos”, apontou.
Para o ex-presidente da Receita Federal há “caminhos para uma reforma tributária”: “abdicar de soluções prontas, construir um consenso sobre os problemas tributários, agir com transparência nas negociações entre os entes federativos e começar pela resolução dos problemas presentes. Há muito o que fazer. Tem que reformar o processo tributário, para reduzir os litígios e a insegurança jurídica, além de reduzir a burocracia e revisar os critérios de partilha no federalismo”.
“Autonomia preservada”
Segundo palestrante do almoço-debate, o prefeito Edvaldo Nogueira afirmou que “a reforma tributária está cheia de enunciados genéricos, sem comprovação de sua efetividade, mas com grande impacto negativo no federalismo, prejudicando os municípios brasileiros”. Ao comparar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto Sobre Serviços (ISS), Edvaldo mostrou que a carga tributária do ICMS é muito maior- cerca de 46% – do que a do ISS, que é de 8%. “O que demonstra que é preciso atuar sobre o ICMS e não sobre o ISS”, avaliou o prefeito.
Neste sentido, de acordo com Edvaldo, a fusão destes impostos, além de inconstitucional, poderá gerar grandes consequências. “Pode gerar desemprego, com uma transição complexa e a criação de alíquotas muito elevadas, as mais altas do mundo: de 25% a 30%. Também trará prejuízos de R$ 415 bilhões para os municípios em 15 anos, além de sobrecarga de tributos sobre o setor de serviços e agronegócios”, reforçou.
Em sua fala, Edvaldo, que preside a Frente Nacional de Prefeitos, defendeu também a PEC 46, que preserva a autonomia de cada ente federativo e abre o espaço para a simplificação dos impostos. O gestor chamou a atenção para o fato de que a proposta, de autoria do senado Oriovisto Guimarães, “é a única que propõe simplificações aos processos tributários, diferentemente das PECs 45 e 110, que deixam os processos mais burocratizados e de difícil fiscalização, além de não deixar claro os impactos sobre os preços e empregos”, considerou.
Para Edvaldo, para que a reforma tributária aconteça, de maneira efetiva, “é necessário que haja um consenso nacional”. “É preciso debate e diálogo efetivo. Não sabemos os impactos das PECs 45 e 110, porque não existem estudos. Elas reduzem a importância dos municípios e, com isso, voltaremos ao período dos municípios de pires na mão. Isso não pode acontecer. A autonomia dos municípios precisa ser mantida. Não dá para aceitar uma redução de autonomia, não dá para prejudicar o município enquanto ente federado, justamente porque é na cidade onde a vida acontece, onde os serviços são efetivamente prestados aos cidadãos”, completou.
“Não atende aos interesses dos país”
Também palestrante do evento, o vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas, Marcos Cintra, disse que os debates propostos para discussão da temática “não estão colocando uma reforma tributária minimamente necessária para o país”. “São debates que não atendem aos interesses do Brasil, do ponto de vista conceitual, empresarial e social. Reforma tributária é uma construção que envolve todas as variáveis de uma sociedade e não é o caso das PECs 45 e 110 que estão sendo discutidas no número”, pontuou.
Marcos Cintra concordou com o posicionamento exposto pelo prefeito Edvaldo Nogueira de que a reforma tributária “começa na simplificação”. “O cidadão quer facilidade, desburocratização, menos litígio e uma carga tributária aceitável. E isso não está sendo apresentado à sociedade. Não há como misturar tributos federais, estaduais e municipais. É inviável essa simplificação verticalizada. Mas é possível e saudável fazer a simplificação dos impostos em cada nível da Federação”, afirmou, acrescentando que, na sua visão, a desoneração de todas as folhas de pagamento deve ser incluída em uma proposta da reforma tributária. “Isso é fundamental”, frisou.
Secretário municipal da Fazenda, Jeferson Passos avaliou o almoço-debate como “um encontro profícuo”. “Foi um debate interessante, que buscou alternativas para as PECs 45 e 110, que estão tramitando no Congresso, e que apresentou a proposta 46, defendida pelos municípios brasileiros. O debate sobre a reforma tributária é um debate que Aracaju vem participando nacionalmente, seja através do prefeito Edvaldo Nogueira, como presidente da Frente Nacional de Prefeitos, seja através da minha participação, no grupo de trabalho do Ministério da Fazenda, e esse é um tema que interessa a todo o empresariado, assim como a sociedade e aos governos. O que fizemos neste evento do Lide foi colocar a visão dos municípios e de que forma eles serão impactados com uma reforma que não preserve a autonomia e que retire das cidades o ISS”, disse.
Além dos empresários filiados ao LIDE, estiveram presentes no almoço-debate o presidente da Câmara Municipal de Aracaju, vereador Ricardo Vasconcelos, os vereadores Nitinho Vitale e Vinicius Porto, a deputada federal Yandra Moura, a secretária estadual da Fazenda, Sarah Tarsila Araújo Andreozzi, e o secretário de Estado da Casa Civil, Jorginho Araujo.
Foto: Ana Lícia Menezes