“Habeas corpus respeita o foro constitucional e repõe trem aos trilhos”, diz Aurélio Belém
Por Jozailto Lima
O advogado criminalista Aurélio Belém do Espírito Santos, do Escritório CESD Advogados Associados e autor da ação que conseguiu do Judiciário habeas corpus suspendendo a investigação do Ministério Público sobre o deputado Augusto Bezerra (DEM) no processo das subvenções, diz que a medida impõe respeito ao foro constitucional por prerrogativa de função e repõe aos trilhos um trem desgovernado. Além disso, ele afirma que a decisão do TJ/SE “pode e deve” ser extensiva aos demais deputados na mesma situação. “A liminar do desembargador Alberto Gouveia traz à baila o respeito que o Judiciário tem pelas Constituições Federal e Estadual e revela a preocupação com a tramitação imaculada de um procedimento rigorosamente dentro dos aspectos constitucionais e do devido processo legal. Ficou patente a necessidade de que a formalidade processual garanta os direitos elencados nas Constituições. Em verdade, eu já esperava que o Tribunal de Justiça assim se posicionasse”, diz o advogado. Segundo Aurélio Belém, a forma como o Ministério Público levou a cabo as investigações, desrespeitava o foro por prerrogativa de função e a autonomia do Judiciário, que deveria ter sido consultado antes para permitir ou não que a investigação seguisse em frente. “A partir de um primeiro momento em que o nome do deputado foi citado na investigação, deveria o Ministério Público, necessariamente, ter remetido os autos ao procurador-geral para que este solicitasse autorização do Tribunal de Justiça ante a prerrogativa de foro que detém o deputado, enquanto membro de um Poder. Esta prerrogativa não é um direto do deputado isoladamente e sim uma garantia constitucional do Poder ao qual ele pertence” diz.
Como é que o senhor recebe a decisão do desembargador Alberto Romeu Gouveia Leite, dando habeas corpus que suspende as investigações contra o deputado Augusto Bezerra?
Recebo com muita felicidade. A liminar do desembargador Alberto Gouveia traz à baila o respeito que o Judiciário tem pelas Constituições Federal e Estadual e revela a preocupação com a tramitação imaculada de um procedimento rigorosamente dentro dos aspectos constitucionais e no devido processo legal. Ficou patente a necessidade de que a formalidade processual garanta os direitos elencados nas Constituições. Em verdade, eu já esperava que o Tribunal de Justiça assim se posicionasse a partir da história de vanguarda do desembargador-relator Alberto Gouveia, um homem sério, que dedicou a sua à prestação do bom serviço jurisdicional, e quem acompanha seu trajeto em Itabaiana irá concordar comigo – daí eu receber esta decisão com muita alegria.
Mas é uma decisão, liminar. Isso lhe deixa preocupada com o futuro do processo e do seu cliente, em particular?
Não, de forma alguma. É verdade que se trata de uma decisão cautelar, que visa resguardar para que os atos processos não sejam maculados no futuro. Ou seja, ela suspende a tramitação da investigação para que novos atos ilegais não sejam praticados sem a devida autorização do Tribunal de Justiça.
E o que alega, enfim, o desembargador para suspender a investigação?
O que aconteceu neste caso foi o seguinte: existe uma investigação via inquérito civil que foi instaurado no Ministério Público para apurar possíveis atos de improbidade administrativa na esfera das chamadas verbas de subvenções repassadas por parlamentares para algumas associações – e aqui quero dizer que são regiamente legais e constitucionais. No curso dessas investigações, de natureza civil, surgiram indícios criminais que apontavam o nome do deputado Augusto Bezerra como suposto envolvido. A partir de um primeiro momento em que o nome do deputado foi citado na investigação, deveria o Ministério Público, necessariamente, ter remetido os autos ao procurador-geral para que este solicitasse autorização do Tribunal de Justiça ante a prerrogativa de foro que detém o deputado, enquanto membro de um Poder. Esta prerrogativa não é um direto do deputado isoladamente e sim uma garantia constitucional do Poder ao qual ele pertence.
O que o senhor pleiteou junto ao Judiciário foi uma garantia dessa prerrogativa e foi exatamente isso o que o desembargador concedeu?
Foi exatamente isso. A autorização judicial que deveria existir no início da investigação não houve, e, mesmo assim, ela prosseguiu, aprofundando a investigação de possíveis e supostos indícios criminais em relação ao deputado, caracterizando-se algo indevido, exatamente pela falta dessa autorização prévia e desse controle jurisidicional.
Essa decisão liminar favorece diretamente a Augusto Bezerra. Mas ela pode ser extensiva aos demais parlamentares envolvidos nas subvenções?
Pode e deve, desde que os indícios envolvam os nomes desses parlamentares nessas investigações. A partir do momento em que um nome de um parlamentar passe por essa investigação, rotulada como civil, porém de natureza eminentemente criminal, automaticamente ele também pode ser alcançado pelos benefícios desta decisão.
Mas a sociedade reclama, e muito, dos abusos em relação às subvenções. O senhor acha que esse habeas corpus desconhece esse queixume?
Não acho não, embora não seja meu papel julgar isso. Na verdade, o habeas corpus não proíbe investigação alguma. Ele apenas tenta recolocar nos trilhos um trem que corria desgovernado. Ele diz o seguinte: está suspensa investigação, pois não há autorização para que ela siga em frente, e vamos avaliar os atos já praticados para decidir se eles são válidos ou nulos, pois foram produzidos sem a devida e necessária autorização de quem de direito, que é a do Poder Judiciário, guardião da constituição, depois de consultado pela Procuradoria-Geral. Aliás, sem a supervisão. Porque não basta só autorizar. O Tribunal tem que autorizar, acompanhar e supervisionar toda a produção de provas.
E não lhe vem ao caso analisar os atos praticados com as verbas de subvenções pelos deputados?
Não. Não é o momento para a discussão desse mérito. A mim não cabe essa discussão, e o que se tem, em resumo, é uma necessidade de adequação da investigação. Ou seja, vamos tramitar uma investigação garantindo os preceitos constitucionais previstos nas duas Constituições. De nada adianta que essa investigação seja feita de qualquer forma. Não pode haver maquiavelismo por parte daquele que deve fiscalizar a lei. Respeito o Ministério Público Estadual, como órgão constitucional defensor da sociedade, conheço bem os promotores envolvidos na investigação e posso atestar a dedicação, competência, ética e retidão de cada um deles, mas, nesse caso, data vênia, eles estão equivocados.
Pelo seu escritório passam outros parlamentares ou só Augusto Bezerra?
Atendo a outros parlamentares e, inclusive, sob a luz deste habeas corpus, estarei analisando as situações deles para que possa tomar as medidas cabíveis.
O Ministério Público questiona o efeito da decisão liminar. Qual seria o alcance e efeito prático dela?
Para mim, o alcance da decisão é bastante claro. Talvez o Ministério Público possa não ter compreendido a fundo a questão, pois não se suspendeu apenas um inquérito civil, finalizado ou não, mas toda investigação dele decorrente. O desembargador relator Alberto Gouveia compreendeu bem a questão, e agiu com um verdadeiro magistrado imparcial, pois mesmo com um habeas corpus em mãos com pedido urgente de medida liminar preferiu somente decidir após ouvir o Ministério Público, que falou nos autos e pode expor a sua versão. No entanto, mesmo assim, após o exercício do contraditório, sua excelência enfrentou a questão posta reconhecendo que havia investigação indevida dentro e fora do inquérito civil e, com isso, resolveu suspender as investigações ministeriais, por concordar com nossa tese. Portanto, não foi somente o nominado “inquérito civil 038” que foi suspenso pela liminar, mas sim todo e qualquer ato de investigação de qualquer natureza, ou na iminência de vir a ser realizado, decorrente de procedimento investigatório instaurado pelo tal inquérito civil, obstando a realização de qualquer diligência probatória, em curso ou cujo material esteja sob análise, até o julgamento do mérito do habeas corpus, conforme consta da decisão.