Por Paulo Márcio
Fazer frente às ações de um estrategista como Vladimir Putin é uma tarefa árdua e espinhosa para qualquer estadista ou diplomata, por maior que seja o seu preparo ou o poder do país que representa. Ao colocar 190 mil soldados na fronteira com a Ucrânia, incluindo os rebeldes separatistas, o presidente russo causou um frisson no mundo inteiro, que ficou aguardando, apreensivo, a invasão do país vizinho.
Enquanto o ocidente monitorava as tropas russas com seus satélites e aviões espiões de última geração, o ardiloso Putin foi à televisão de posse de uma inofensiva caneta para reconhecer a independência de dois territórios da Ucrânia controlados por separatistas pró-Rússia: Donetsk e Luhansk, ambos na região do Donbass. Ato contínuo, sob o pretexto de manter a paz e defender os cidadãos russos contra uma possível retaliação de Kiev, Putin determinou o envio de tropas russas para as duas neonatas repúblicas, violando ainda mais o território ucraniano.
Um desrespeito à integridade territorial e à soberania ucranianas? Sim, sem sombra de dúvida. Mas algo infinitamente menor do que uma agressão armada à Ucrânia, como se temia – mas que não está descartada, como se verá adiante, sendo este o busílis da questão. De modo que este mal menor, por assim dizer, será recebido com um certo alívio pela OTAN, que vinha se preparando para um grave confronto contra uma potência que parece ter recuperado não só a economia e o aparato militar, como a autoestima dos tempos do império soviético.
A cartada de Putin, travestida de ato diplomático, no entanto, é no sentido de fazer crer que Moscou, durante todo esse tempo, não almejava invadir a Ucrânia, mas somente proteger parte dos cidadãos russos residente no Donbass. Para manter a farsa, o protoditador russo ficará em compasso de espera, aguardando um ato hostil de Kiev. Se a Ucrânia, sozinha ou com a ajuda de aliados, tentar retomar os territórios independentes, vale dizer, roubados por Putin e seus rebeldes mercenários, a Rússia não hesitará em invadir militarmente o país, anexando-o ou instalando um governo fantoche, à custa de milhares de mortes de civis.
Mas o inimigo, sabendo dos planos de Putin, vai dar esse pretexto tão aguardado pela Federação Russa? Receio que sim, pois uma omissão não só seria inaceitável do ponto de vista da defesa da soberania como provocaria uma grande instabilidade no país, criando um ambiente propício para Putin avançar sobre outros territórios, usando os separatistas como testa de ferro.
A verdade é que a Ucrânia se encontra em uma encruzilhada e, apesar dos discursos e apelos dos maiores [sic] líderes mundiais, não se sabe até que ponto os Estados Unidos e a Europa estão dispostos a se empenhar para garantir sua independência e integridade territorial.
Ademais, está mais do que provado que acordos como os de Minsk não servem senão para ser solenemente ignorados por Moscou. Assim, enquanto o czar Vladimir Putin exalta Lênin e o glorioso passado russo, exigindo um tributo da “moderna Ucrânia” à antiga União Soviética no exato momento em que ofende despudoradamente sua soberania, resta-nos tão somente lamentar a falta de um Ronald Reagan ou de um Winston Churchill neste mundo de claudicantes Bidens e Macrons.
Paulo Márcio Ramos Cruz é analista político e delegado de Polícia Civil