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Não há política local que possa resolver o problema das drogas a contento

Por Joedson Telles

O presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil de Sergipe (Adepol), o delegado Paulo Márcio, comenta nesta entrevista a ligação dos crimes praticados em Sergipe, sobretudo os homicídios, com as drogas e responde se a polícia perdeu a guerra, já que diagnosticou, mas não venceu a doença. “O tráfico de drogas é o flagelo da juventude pobre, negra e periférica do Brasil. E não há política local que possa resolver isso a contento, embora a repressão qualificada ao tráfico feita pelo Denarc e a prevenção realizada pela Polícia Militar venham surtindo algum efeito”, diz o delegado, que faz um balanço da sua gestão na Adepol, dos projetos futuros, caso se reeleito e ainda tenta explicar o lugar comum “a polícia prende e a Justiça solta”. “O problema está na política criminal adotada e no sistema de Justiça Criminal que consagramos. Ao contrário do que prega o velho adágio, “no Brasil o crime compensa”, sobretudo para os barões do tráfico e chefes de organizações criminosas, que gozam de impunidade e, mesmo presos, exercem seu poder de mando através de uma rede formada por agentes públicos e advogados corruptos”, afirma. A entrevista:

O senhor tentará ser reeleito presidente da Adepol, na próxima quarta-feira, dia 8. Qual o balaço da atual gestão, que se encerra no dia 31 de dezembro?

Temos absoluta convicção que demos importantes passos rumo à consolidação da carreira de delegado de Polícia Civil de Sergipe, muito embora reconheçamos que ainda há muito por ser feito. Internamente, fizemos uma prestação de contas aos nossos associados e filiados, enumerando as conquistas do último triênio. Destas, eu destaco as seguintes: a) redução da jornada de trabalho de 40 para 36 horas semanais; b) aumento da Remuneração Provisória pelo Exercício da Atividade de Plantão (congelada desde 2014); c) fixação do turno de 6 horas contínuas, por enquanto, só na Grande Aracaju, mas que já negociamos com a Administração para que seja estendido ao interior; d) regulamentação da acumulação de delegacias no interior do Estado, depois de 16 anos de irregularidade, negligência e locupletamento ilícito do Estado; e) implementação do subsídio da Polícia Civil em maio de 2016, após um ano de intensa luta ao lado do Movimento Unificado dos Servidores e Empregados Públicos Estaduais; f) acordos com a Administração que permitiram a deflagração do processo de promoção automática antes do retorno das finanças ao limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal, beneficiando 142 delegados e centenas de agentes e escrivães; g) pagamento de 600 mil reais em horas extras atrasadas para delegados, agentes e escrivães; h) acordo para o pagamento da indenização pela venda da licença-prêmio para 20 delegados; i) criação do cargo de Delegado Regional, que só existia de fato, mas não de direto, desde 1999; j) fixação de um efetivo mínimo para as delegacias, além de importantes ações internas que valorizaram a carreira e a melhoraram a imagem institucional do delegado de polícia.

O que não foi possível ser feito, mas espera uma nova oportunidade para fazer?

Não obstante as inúmeras conquistas nesses últimos três anos, outros objetivos não foram alcançados por uma série de adversidades que, no âmbito da Adepol, foram exaustivamente debatidas e compreendidas. O principal deles foi a proposta de equiparação salarial com procurador do Estado, cujas tratativas evoluíram para um acordo que, lamentavelmente, não se concretizou. A boa notícia é que, atendendo a uma solicitação do próprio governo, apresentamos uma proposta substitutiva, no mês de maio, com o compromisso de retomarmos a negociação em setembro, após a aprovação do projeto que resultou na lei estadual 8.272/17. Uma vez que já foram cumpridas as etapas iniciais, já estamos novamente negociando com o governo, que, nesse particular, encontra-se em débito com os delegados, na medida em que atendeu aos procuradores do estado e gestores públicos, relegando-nos, inexplicavelmente, a plano secundário.

Além disso, o que seria a prioridade de uma nova gestão?

A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição Estadual, reconhecendo a natureza jurídica da carreira de delegado de Polícia Civil, assim como já  fizeram mais de 15 Estados da federação, talvez seja a nossa principal bandeira, aliada a uma série de medidas que visam à profissionalização e autonomia da Polícia Civil, sem falar, obviamente, na adoção de medidas judiciais e administrativas para a promoção e proteção dos direitos previdenciários dos delegados, garantindo-se a integralidade e paridade aos nossos inativos.

A Adepol emitiu uma nota, na semana passada, alertando sobre prejuízos que o Conselho de Reestruturação e Ajuste Fiscal do Estado de Sergipe (Crafi/SE) pode provocar à categoria. O que motivou o desabafo?

A Adepol se insurgiu contra uma medida abusiva do Crafi, que, unilateralmente, suspendeu a eficácia de uma lei estadual já em vigor. Felizmente, o governador Jackson Barreto e o vice Belivaldo Chagas, alertados tanto por nós quanto pelos gestores da Segurança Pública, determinaram a rápida reanálise do caso. Por fim, o direito e o bom senso prevaleceram, e o primado da legalidade foi celeremente restaurado, tanto que os plantões e sobreavisos funcionaram normalmente neste feriadão.

Isso prejudica a relação da Adepol com o Governo do Estado?

Pelo contrário: esse fato só reforça a importância do diálogo aberto e permanente entre a Adepol e o Governo, pois equívocos podem ser cometidos por ambas as partes. O que vai qualificar a relação é este compromisso e agilidade para tomar decisões que corrijam imprecisões e reforce os laços de confiança mútua.

O que ainda está na agenda para ser discutido este ano com o Governo do Estado?

Dado o curto período de tempo que nos resta, nosso foco é exclusivamente a questão salarial.

Como a Adepol está acompanhando toda esta polêmica em torno do grande número de homicídios registrados em Sergipe?

O Anuário divulgado, na semana passada, é relativo a 2016, quando chegamos à marca de 64 homicídios por grupo de 100 mil habitantes. Mas já tivemos uma considerável melhora em 2017. É possível que saíamos em breve da liderança e, mantida a política de investimentos na segurança pública e sistema prisional, valorização profissional e concurso permanente para as polícias, perícia e agentes prisionais, possamos reduzir a níveis aceitáveis os crimes que mais afetam a população e a economia.

Há uma tese do secretário de Segurança Pública, João Eloy, no sentido de que a maioria dos crimes praticados em Sergipe, sobretudo os homicídios, tem ligação com as drogas. Mas, mesmo diagnosticando a doença, o problema persiste. A polícia perdeu a guerra para as drogas?

Não é só uma tese do secretário João Eloy: é uma constatação baseada em um trabalho criterioso de análise criminal que confirmou aquilo que João Eloy e muitos de nós já havíamos percebido empiricamente: o tráfico de drogas é o flagelo da juventude pobre, negra e periférica do Brasil. E não há política local que possa resolver isso a contento, embora a repressão qualificada ao tráfico feita pelo Denarc e a prevenção realizada pela Polícia Militar venham surtindo algum efeito. Somente uma política criminal corajosa capitaneada pelo Governo Federal poderá impedir que o Brasil se transforme em um imenso, caótico e violento Rio de Janeiro.

A polícia reclama que “enxuga gelo”, pois prende uma pessoa, mas, logo esta ganha à liberdade. Aí dá margem para uma série de comentários: a Justiça erra, os delegados deixam brechas nos inquéritos, os políticos fazem leis frouxas… Como o senhor avalia este problema, que só facilita a vida dos bandidos?

Os erros da Justiça, da Polícia e do Ministério Público são residuais. O problema está na política criminal adotada e no sistema de Justiça Criminal que consagramos. Ao contrário do que prega o velho adágio, “no Brasil o crime compensa”, sobretudo para os barões do tráfico e chefes de organizações criminosas, que gozam de impunidade e, mesmo presos, exercem seu poder de mando através de uma rede formada por agentes públicos e advogados corruptos.

O que o senhor apontaria como experiências que deram certo em outros estados – ou mesmo em outros países – e que deveriam ser testadas em Sergipe para frear a criminalidade?

O Brasil atingiu um nível de barbárie que não encontra paralelo em nenhuma outra democracia do planeta. Por outro lado, temos uma das legislações mais avançadas do mundo em matéria de direitos fundamentais. O criminoso, no Brasil de 60 mil homicídios por ano, é um ser de direitos e garantias mais sagrados do que a de um trabalhador. Não existe modelo que dê certo se aplicado aqui, por absoluta falta de identidade de condições. As experiências da Colômbia e Nova Iorque são objeto de reiterados debates, mas as tentativas de replicá-las no Brasil foram um fiasco. Vide os inúteis teleféricos e UPPs implantados no Rio de Janeiro por Cabral. Uma lástima. Nosso desafio é, sem nos desviarmos da democracia, esmagar a criminalidade antes que ela sequestre o Estado.

A Adepol entendeu a exoneração da delegada Danielle Garcia?

A Adepol acompanhou com bastante cuidado toda essa mudança no Deotap, colocando-se à disposição dos delegados Danielle Garcia e Gabriel Nogueira naquilo que fosse necessário. Ambos já assumiram suas novas unidades e estão trabalhando com o mesmo zelo e profissionalismo que sempre os distinguiram. O Deotap também está em boas mãos, sob a coordenação da doutora Thaís Lemos e mais duas divisões, uma delas sob o comando da delegada Nádia Flausino Vitolo, que, ao lado de Danielle Garcia, atuou nos mais importantes casos de combate à corrupção de que se tem notícia.

Recentemente, o delegado Alessandro Vieira, que parece empolgado com a política partidária, participou de um debate com o ex-deputado Mendonça Prado, numa emissora de rádio, e, entre outras cutucadas, foi acusado, em tom de pito, de ganhar dinheiro sem trabalhar. O envolvimento de um delegado com a política, de alguma forma, é maléfico para a imagem da Polícia Civil, já que político é uma classe em descrédito junto à população?

De forma alguma. A política, embora desvirtuada por um bando de malfeitores, é o meio mais democrático e legítimo para a defesa da sociedade – representada pelos seus mais diversos segmentos -, e transformação da realidade que nos circunda. Particularmente, não tenho nenhuma pretensão política. Mas acho salutar que colegas da Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal disputem cargos eletivos. Melhor ainda se, uma vez eleitos, eles defendam a instituição que os projetou.

Modificado em 06/11/2017 07:02

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