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“Reconhecer os riscos da obesidade não é o bastante”, diz Ketlin Melo

Nutricionista aponta ainda um SUS fortalecido e políticas públicas baseadas na ciência

Por Joedson Telles 

A nutricionista Ketlin Melo destaca, nesta entrevista, que concede ao Universo, neste domingo, dia 15, que reconhecer os riscos da obesidade para a saúde não é o bastante para conter o avanço da doença no Brasil. “É de suma importância que tenhamos um SUS fortalecido, políticas públicas baseadas em evidência científicas, bem como a criação de ambientes saudáveis propícios à prática de atividade física e a segurança alimentar e nutricional da população”, diz Ketlin. Ela também aponta os riscos de uma pessoa tentar “administrar” uma dieta sem a orientação de um profissional e vê como utopia os políticos aprovarem uma lei proibindo a comercialização de alimentos que, comprovadamente, fazem mal a saúde.

Quais os principais avanços no combate à obesidade na área da Nutrição?

Dados da pesquisa Vigitel (Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico), do Ministério da Saúde, mostram que, em 2006, um em cada 10 (11,8%) adultos residentes nas capitais brasileiras e no Distrito Federal viviam com obesidade. Em 2019, essa proporção dobrou para dois em cada 10 (20,3%) adultos. Reconhecer os riscos da obesidade para a saúde não é o bastante para conter o avanço da obesidade no Brasil. É de suma importância que tenhamos um Sistema Único de Saúde (SUS) fortalecido, políticas públicas baseadas em evidência científicas, bem como a criação de ambientes saudáveis propícios à prática de atividade física e a segurança alimentar e nutricional da população. Hoje, o Brasil conta com o Guia Alimentar para a População Brasileira, reconhecido internacionalmente. Instrumento que visa “apoiar e incentivar práticas alimentares saudáveis no âmbito individual e coletivo, bem como para subsidiar políticas, programas e ações que visem a incentivar, apoiar, proteger e promover a saúde e a segurança alimentar e nutricional da população”.

Quais os riscos que uma pessoa obesa está sujeita, quando abre mão dos serviços de um nutricionista e, ela mesma, tenta administrar uma dieta?

A obesidade é uma doença crônica complexa e multifatorial caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, sendo fator de risco para o desenvolvimento de diversas doenças como: diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares – e até mesmo câncer. Geralmente, quando as pessoas administram uma dieta sem orientação do profissional capacitado, acabam fazendo restrições calóricas muito severas. Essas restrições podem desencadear alterações hormonais, como: aumento do cortisol, diminuição dos hormônios T3 e T4, redução na concentração dos hormônios sexuais, desregulação dos hormônios da fome e saciedade (leptina e grelina). Isso tudo gera uma diminuição do metabolismo. Além das alterações fisiológicas, as dietas restritivas também podem afetar o psicológico, ocasionando compulsão alimentar e criando uma relação disfuncional com os alimentos.

Então, é um grande equívoco pensar que consultar um nutricionista é um “artigo de luxo”?

O nutricionista é o profissional da área da saúde que estuda as relações entre os alimentos e nutrientes ingeridos pelo ser humano e possíveis estados de saúde e doença. O trabalho do nutricionista reside, majoritariamente, na orientação de uma alimentação adequada, a fim de manter o organismo em equilíbrio e saudável. Por isso, é de extrema importância ter um acompanhamento nutricional. Vale salientar que após a criação da Lei Orgânica do SUS (Sistema Único de Saúde) foi feita a publicação da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), que consiste na promoção de práticas alimentares saudáveis e a prevenção e controle de agravos nutricionais relacionados à insegurança alimentar e nutricional. Portanto, a população, de modo geral, pode e deve ter acesso a um nutricionista.

As pessoas estão mais conscientes da importância de uma boa alimentação para ter saúde? Estão procurando mais os consultórios dos nutricionistas?

Estamos inseridos num ambiente obesogênico, ou seja, o ambiente promove acesso amplo e facilitado a alimentos de alta densidade energética e pouca densidade nutricional (ricos em açúcares e gorduras). Além disso, a praticidade da era tecnológica tornou nossa geração menos ativa e mais preguiçosa. Basta abrir um aplicativo e pedir lanche sem nem se levantar do sofá. Todo esse contexto obesogênico impacta diretamente na nossa saúde. Por esse motivo, acredita-se que as pessoas estão buscando melhorar a qualidade de vida através da nutrição, enxergando a dieta não como algo prejudicial, mas sim como uma parte saudável e essencial de sua rotina diária. Culturalmente, as pessoas, muitas vezes, só procuram profissionais de saúde quando estão doentes, e o nutricionista desempenha um papel fundamental nesse cenário, ajudando a prevenir doenças e promover hábitos alimentares saudáveis desde o início, ao invés de apenas tratar as enfermidades já estabelecidas.

O que é uma boa alimentação?

Uma alimentação saudável é aquela que oferece ao corpo nutrientes necessários para o seu bom funcionamento, permitindo que o indivíduo tenha uma saúde equilibrada e uma boa qualidade de vida. Uma boa alimentação consiste no equilíbrio entre uma dieta que prioriza os grupos alimentares in natura, que fazem bem para a saúde do ser humano, como: frutas, verduras, legumes, sementes integrais, proteínas magras e gorduras boas, e os alimentos ditos “não tão saudáveis”, como os industrializados. Se 80% da sua alimentação é baseada em alimentos in natura, os ultraprocessados podem, sem maiores prejuízos, fazer parte dos 20% restantes.

Quais os principais hábitos alimentares que os nutricionistas apontam como prejudiciais à saúde?

Ter uma dieta desbalanceada rica em alimentos ultraprocessados que são formulações industriais feitas inteiramente ou majoritariamente de substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, açúcar, amido, proteínas), derivadas de constituintes de alimentos (gorduras hidrogenadas, amido modificado) ou sintetizadas em laboratório com base em matérias orgânicas como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes, realçadores de sabor e vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de propriedades sensoriais atraentes). E carente em ingestão de frutas, verduras, leguminosas, cereais e grãos.

Os políticos poderiam aprovar alguma lei que ajudaria neste importante papel dos nutricionistas? Uma lei, por exemplo, proibindo a comercialização de certos alimentos que, comprovadamente, fazem mal à saúde?

Acredito que seja uma utopia pensar na possibilidade de uma lei que proíba a comercialização desse tipo de alimento devido ao forte poder que a indústria alimentícia possui no Brasil. Porém, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que é o órgão que estabelece quais as informações devem constar nos rótulos dos alimentos, publicou novas normas sobre rotulagem nutricional, que entraram em vigor em 9 de outubro de 2022. O objetivo é facilitar a compreensão das informações nutricionais presentes nos rótulos dos alimentos e assim auxiliar o consumidor a realizar escolhas alimentares mais conscientes. As normas estabelecem uma rotulagem nutricional frontal sinalizando ao consumidor quando o alimento possui alto teor, sódio, açúcar ou gordura. Nesse contexto, a ampliação das campanhas de conscientização acerca dos alimentos ultraprocessados se torna a forma mais viável de ajudar as pessoas a fazerem escolhas mais saudáveis e informadas.

Modificado em 15/10/2023 09:18

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