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“Requiem aeternam”

Por David Leite

Não nego, tive lá minhas divergências com a professora Marlene Calumby, irmã do ex-governador João Alves Filho.

Já contava mais de 16 anos de trabalho ininterrupto ao lado do Negão, viajando o mundo, o Brasil e Sergipe com ele – por aqui, com os amigos Chiquinho e Capitão Nilton –, de repente, pelos idos de 2011, chega-me a distinta de forma mais incisiva e passa a cultivar entre nós – e não apenas comigo, frise-se! – o sentimento da discórdia e divergência.

Isso é coisa do passado, hoje temos convivência pacífica e respeitosa, como bons amigos.

À época, porém, já em razão do processo inicial do Alzheimer, o chefe teve reações “estranhas” a tudo aquilo e também em decisões no trabalho. Ainda sem informações sobre seu real estado de saúde, passei a ver um João Alves Filho cada vez mais transfigurado e com certas atitudes em desacordo com o estilo dele, sempre muito educado, ponderado, conselheiro e agregador.

Em 2012, após a vitoriosa campanha, fomos nos afastando cada vez mais, tanto que sequer participei da gestão na Prefeitura de Aracaju. Mas num dado momento, estávamos em Brasília, era dezembro daquele ano, e o acompanhei em visita ao ex-governador Lourival Baptista, que morreria meses depois [março de 2013] aos 97 anos de idade, vítima justamente de Alzheimer.

Na saída do apartamento ele me comentou: “Essa é a pior forma de morrer”. Hoje, entendo que ele já tinha um diagnóstico positivo da doença, no entanto, se falou para alguém, desconheço.

Vêm e vão memórias de instantes estelares com JAF, um mestre e mentor. Era um homem solitário, de pouquíssimos amigos.

O amor de João Alves Filho por Sergipe só não superava o amor pela família. Falava dos filhos, em especial de Ana Maria, com uma força sentimental notável, mais das vezes lembrando de quando nem sempre, por causa da política, podia estar com eles.

Nas incontáveis viagens, quando ele não dormia – sim, adorava tirar homéricos cochilos –, as conversas fluíam. Dos encontros com líderes poderosos como Deng Xiaoping e Mikhail Gorbatchov e as revoluções comunistas, passando pela admiração ao ex-presidente José Ribamar Sarney, à arte, à ciência – ficava intrigado quando eu falava sobre extraterrestres – e sobretudo à literatura, nada escapava daquela mente arguta e destinada a antever o futuro.

Rimos muito juntos! A gargalhada dele ecoava por léguas e contagiava de alegria e energia a todos que o circundavam…

Também ficávamos longos períodos em silêncio, quase sempre lendo ou observando obras de arte em museus – uma das muitas paixões culturais que nutria com esmerado afinco – ou nas livrarias, indubitavelmente sua grande e mais fervorosa paixão. Presenteava livros mesmo para quem jamais os abriria: “Talvez, quem sabe um dia o gosto pela leitura seja despertado”, dizia.

Algumas frases me serão para sempre repisadas na mente, pois ditas de um jeito que somente ele era capaz de dizer: “Nunca subestime a estupidez humana”; “O pior tipo de idiota é o com iniciativa”; “Não atrapalhe o adversário quando ele estiver errando”; “Vocês são loucos e querem me enlouquecer [referência a mim e ao colega jornalista César Gama, diante de alguma estripulia – e eram muitas]”; “David, cadê o texto, meu filho?”.

Como agora não fazer minhas as palavras de Marlene Calumby ao colega Gilmar Carvalho e repercutido por Joedson Telles  na manhã de hoje, ao apelar para a família que o corpo de JAF não seja cremado em Brasília e somente as cinzas venham a Sergipe, mesmo que o féretro chegue lacrado [em razão da Covid que o acometeu] para ser enterrado ao lado do pai que tanto amava?

Diz ela que o irmão não pertence à família, mas ao povo de Sergipe! Sim, prezada professora, você tem razão: João Alves Filho, o João do Povo, pertence a todos nós sergipanos que tanto o amamos e reconhecemos nele o maior homem público de todos os tempos na História deste pequeno grande Estado.

Que ele seja, portanto, enterrado entre os seus familiares e conterrâneos, na terra que sempre amou, como certamente ele mesmo desejaria. E assim tenha o merecido repouso eterno em paz…

 

Modificado em 23/11/2020 15:52

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