Por Joedson Telles
Voz vencida, não sem antes dar carona ao sentimento do Brasil por justiça, o ministro do TSE Herman Benjamin, relator do sepultado processo de cassação da chapa Dilma/Temer, sob a acusação de abuso do poder econômico, soltou o verbo: “Recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas eu não carrego o caixão”.
A frase é um resumo da ópera. Um 3 x 4 dos longos dias de julgamento. Das horas utilizadas pelo relator para compreender os fatos com a imparcialidade que todo processo não viciado exige, e colocar em prática a beleza do direito, ao tentar persuadir em favor do coletivo mediante as provas sempre inseparáveis do bom direito.
Entretanto, atrevo-me a externar como engendraria o sentido da frase dentro do mesmo contexto. Coisa de quem tem como ofício a confecção de texto. A inquietação sempre ousa sugerir alternativas. Ainda quando tudo espelha esmero. Lá vai: “… sou obrigado a participar do velório do defunto que jamais ajudaria a emergir”. Eis a frase depois de usar da empatia com o relator…
Ao recusar os argumentos do relator, que, aliás, como foi dito com muita propriedade pelo ministro Luiz Fux, “ninguém conhece o processo como Herman Benjamin”, os quatro ministros que votaram contra a cassação da chapa não livraram apenas as peles de Temer e Dilma – o que, por si só, já seria algo escandaloso, a julgar pela ótica dos três ministros que argumentaram e votaram pela cassação em tom de indignação. O dia de ontem é bem maior. É que um país embrutecido jamais consegue discernir o tamanho da chaga de pronto.
A decisão do TSE frustra a esmagadora maioria dos brasileiros por estar na contra mão de um novo Brasil sonhado à sombra da Lava Jato. Acorda com uma bofetada no rosto a deixar marca. Até quem sequer entendia o que os ministros falavam, nestes últimos dias, com vocabulário apropriado para a corte, queria o contrário. Há exemplo de indignação do mais preparado doutor ao não alfabetizado. Podem ter certeza.
Propina oriunda de empreiteira, Caixa 2 e até Caixa 3, poupança propina, envolvimento de gráficas, que receberam ser prestar serviços, partidos pequenos vendendo tempo de TV, a Petrobras a financiar a desfaçatez… Os argumentos do relator arrepiam.
Todavia de que adiantou o relator se debruçar na carniça? Lógico tem o caráter ideológico. Evidente que pior seria se perdêssemos por completo a capacidade de se indignar com o erro. Mas, em termos práticos, criou-se uma expectativa que seria asfixiada, posteriormente, sem anestesia pela cultura nativa. Estamos falando de Brasil, não é mesmo? Deu o lugar comum.
Não se trata de transformar este espaço num tribunal tendo o TSE como réu. Nada disso. Até porque quem sou eu para entrar no escopo jurídico e apontar que ministro “A” ou “B” errou? São, ao menos na teoria, os melhores quadros para estarem ali. Legitimados dentro do processo legal. Julgaram dentro das leis. E jamais acusaria sem provas quem quer que seja, imagine um ministro do TSE, de se atrelar à corrupção eleitoral. Longe disso. Sequer tive acesso aos autos.
Todavia é inegável que quando um dos pares da corte, que também, evidentemente, amealhou notáveis conhecimentos jurídicos ao longo da vida, estuda o processo com a responsabilidade de ser o relator e aponta na direção que julga correta com impecável alegação é preciso um argumento muito consistente para se contrariar o que é posto como óbvio. E isso não foi visto. É preciso que se diga.
Alegar que não há provas robustas é permitir o raciocínio lúcido que há, sim, provas de tudo que está a afirmar o relator, só não são robustas. Afirmar que não se substitui um presidente a toda hora não é o mesmo que dizer que um presidente inocente não pode ser violentamente afastado do seu mandato. Descartar a Odebrecht, que aponta o relator, disponibilizou para a campanha R$ 150 milhões? O casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura?
Sem mais… Herman Benjamin já fechou este texto, quando disse que limitou a investigação às suspeitas do PSDB na ação inicial. Quando lembrou que, como juiz eleitoral, tinha poderes para aprofundar as investigações, mas não o fez. Aliás, agiu certo: não seria preciso dada a obviedade do que expôs. Tampouco mudaria o desfecho. Estamos no Brasil, não é mesmo?